Monday, December 20, 2010

das memórias inventadas do poeta

"Eu não amava que botassem data na minha existência. A gente usava mais era encher o tempo. Nossa data maior era o quando. O quando mandava em nós. A gente era o que quisesse ser só usando esse advérbio. Assim, por exemplo: tem hora que eu sou quando uma árvore e podia apreciar melhor os passarinhos. Ou tem hora que eu sou quando uma pedra. E sendo uma pedra eu posso conviver com os lagartos e os musgos. Assim: tem hora eu sou quando um rio. E as garças me beijam e me abençoam. Essa era uma teoria que a gente inventava nas tardes. Hoje eu estou quando infante. Eu resolvi voltar quando infante por um gosto de voltar. Como quem aprecia de ir às origens de uma coisa ou de um ser. Então agora eu estou quando infante. Agora nossos irmãos, nosso pai, nossa mãe e todos moramos no rancho de palha perto de uma aguada. O rancho não tinha frente nem fundo. O mato chegava perto, quase roçava nas palhas. A mãe cozinhava, lavava e costurava para nós."

Sunday, December 12, 2010

uma explicação tardia e um xamego pra uma amiga querida

quem lê esse meu humilde bloguinho sabe que isso aqui não foi criado para ser um sucesso de público - passo um tempão sem atualizar e quando posto, não entro muito em detalhes sobre a minha vida pessoal. a idéia básica é juntar pequenos caquinhos de coisas que me mobilizam, me emocionam, me fazem rir ou chorar, e guardar aqui, como uma caixinha de quinquilharias. ou melhor, como uma caixinha de pequenos milagres (daí o "deusa das pequenas coisas", sacou?), milagres como o milagre das folhas, da clarice lispector.
nessa linha editorial, valem poemas, músicas, trechos de livros, ou simplesmente pequenos casos da minha vida. procuro não falar de coisas negativas embora, não se iludam, elas existam aos montes na minha vida e pela vida aí afora de todo mundo.
procuro também não falar muito de grandes amores. depois de ter levado uma porção de rasteiras na vida no quesito amor romântico, hoje prefiro falar dos pequenos amores, aqueles de amigos, comadres e anjos em geral que atravessam minha vida de alguma forma.
e é aí que entra a história do xamego do título desse post. tem essa amiga antiga, de 20 anos atrás (sim, senhoras e senhores, o tempo passa. e muito rápido!), que eu perdi na roda viva da vida há mais ou menos esse tanto de tempo atrás. a gente virou melhor amiga muito rápido e vivia grudada pra cima e pra baixo (ai, o milagre da amizade...). foi um período importante da minha vida pois era uma espécie de adolescência tardia, e acho que ela também experimentou isso, embora por motivos diferentes.
de repente, não lembro nem muito bem porquê, nos afastamos. até perder contato mesmo, por um tempão. depois de muitos anos, rolou até de nos acharmos no orkut e no facebook, mas nenhum contato mais íntimo. ela foi morar em sampa há tempos, e eu também acabei por esse mundão afora um tempo depois disso.
eis que recentemente, voltando da gringolândia, na viagem derradeira do doutorado, resolvo fazer uma mega arrumação na casa. fui limpando tudo, jogando quilos de coisas fora. e de repente dou de cara com uns cartões e bilhetes que ela me mandou há tempos atrás, quando éramos amigas inseparáveis. eu que já andava meio sensível por conta de outras coisas, desandei num choro daqueles quando encontrei isso e mais umas outras lembranças de outros amigos queridos que a vida também levou com o tempo.
e não é que uma semana depois ela me escreve dizendo que estava no rio com o o marido e que queria me encontrar? (ai, o milagre da amizade...) eu fiquei tão de cara com essa história toda que saí correndo para encontrá-los onde fosse. sentamos no BG e começamos a desfiar histórias antigas. e não é que ela lembrava direitinho de um episódio que ela contava num dos cartões que me escreveu? não só isso, lembrava disso como um episódio importante da vida dela, uma coisa que a marcou profundamente (nem dá pra contar aqui pois o assunto é longo, a história é dela e dá assunto pra outro post).
depois desse reencontro as coisas tomaram seu rumo natural - primeiro ficamos de ti-ti-ti no facebook e finalmente fui visitá-la em sampa semana passada.
chegando lá papeamos sem parar por dois dias, com intervalos pra dormir e pra ela trabalhar. e haja assunto, meu deus! parecia que o tempo não tinha passado. fui percebendo que embora o tempo tivesse passado e um milhão de coisas tivessem acontecido na minha vida e na dela, ainda tínhamos uma porção de coisas em comum e assunto pra mais 20 anos de amizade.
ai, o milagre da amizade...